No ano de 1934, Miguel Reale publica sua famosa obra “O Estado Moderno”, onde reclama uma concepção do Estado que seja uma integração de ser e de dever ser, de realidade natural e de valor e – com o objetivo de dar ao Integralismo os fundamentos jurídico-institucionais de que este necessitava – esclarece o sentido da Democracia Integral.

O Estado Moderno, ou Estado Integral, constitui o Estado Ético, antitotalitário e antiindividualista, cujo traço mais marcante é a consideração global, integral da realidade e dos problemas, que se opõe, por suposto, à visão unilateral do Liberalismo e do Comunismo.

O Estado Integral, que basear-se-á na concepção integral do Homem e do Universo, tendo como base fundamental a intangibilidade do ente humano e o seu livre-arbítrio, não pode ser, em hipótese alguma, confundido com o Estado totalitário de inspiração hegeliana. Como observa o próprio Reale, “só os ignorantes ou os homens de má fé confundem a concepção integralista do Estado com o Estado Hegeliano”.

Para Hegel o Estado constitui “o Espírito enquanto se realiza como consciência do mundo. É a marcha de Deus no mundo que faz com que o Estado exista. Todo Estado, qualquer que ele seja, participa desta essência divina.”

Na concepção do filósofo de Stuttgart, o Estado, que consiste no “racional em si e para si”, é, portanto, como observa Reale, “a idéia absoluta, a personificação da Ética: tudo que provém dele é de ordem moral, em qualquer direção que se manifeste, porque o Estado não erra.”

O Estado Ético da concepção integralista constitui, ao contrário, o Estado subordinado à lei ética. A diferença entre um e outro é, como observa Reale, “essencial: no primeiro a moral subordina-se ao Estado; no segundo, o Estado submete-se ao imperativo moral.”

Poucos descreveram o Estado Integral, ou Estado Moderno, tão bem quanto Goffredo da Silva Telles Junior em seu primeiro livro, intitulado “Justiça e júri no Estado Moderno”, escrito em 1937 e publicado um ano mais tarde:

“Chamamos Estado Moderno o Estado Ético, antiindividualista e antitotalitário. Sem ser princípio nem fim ele é o Estado que se subordina à ordem natural das coisas. Cingindo-se a sua missão de meio, ordena-se por um ideal de finalidade. Criado para servir ao homem,
orienta-se para os alvos que estejam em conformidade com o destino supremo do mesmo. (…) O Estado Moderno é antitotalitário porque faz prevalecer o Moral sobre o Social e o Espiritual sobre o Moral. Reconhecendo a Iniqüidade da tirania, proclama o princípio da intangibilidade da pessoa humana. Em conseqüência, submete-se aos transcendentes interesses do homem.”

Em 1939/40, nas páginas finais de sua obra Fundamentos do Direito, Miguel Reale começa a determinar os princípios da concepção tridimensional do fenômeno jurídico, que assinala um notável esforço de superação e síntese de explicações unilaterais do Direito.

A Teoria Tridimensional do Direito é a única que compreende o fenômeno jurídico na totalidade de seus elementos constitutivos, merendo, destarte, o título de Teoria Integral do Direito.

Na Teoria Tridimensional – ou Integral – do Direito, a análise – como observa Alfredo Buzaid na recepção a Miguel Reale na Academia Paulista de Letras – “não se cinge ao fato jurídico, porque seria um fato social indistinto e indeterminado, nem apenas à norma jurídica, porque seria simples norma ética, sem valor para o mundo do direito.”

A concepção culturalista do Direito do Professor Reale pressupõe – como explica ele em Fundamentos do Direito – “o abandono da antítese ‘ser’ e ‘dever ser’, o que não era possível alcançar no plano do idealismo. O nosso culturalismo – prossegue Reale – desenvolve-se no plano realista e assenta-se sobre a consideração de que a pessoa humana é o valor fonte e que são os valores que atribuem força normativa aos fatos. Assim sendo, o direito é uma ordem de fatos integrada em uma ordem de valores, sendo objeto da jurisprudência e da sociologia jurídica.”

Isto posto, mister se faz sublinhar que a Teoria Tridimensional do Direito – que constitui, sem sombra de dúvida, o maior legado do brilhante filósofo Miguel Reale ao pensamento jurídico do Brasil e do mundo – é há décadas aplicada por juizes de todas as regiões do nosso País e de inúmeras nações estrangeiras.

Adoraria poder dispor de mais linhas para que melhor expusesse a magnífica concepção integral do Estado e do Direito em nosso Mestre Miguel Reale. Como, todavia, não disponho de mais delas, encerro aqui este texto tão singelo, esperando que ele seja compreendido por todos aqueles que o lerem.

Leitura disponível também no blog Espaço Cultural Miguel Reale

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