O Estado forte burocrático deve ser substituído

A diferença entre o Estado burocrático e o Estado orgânico.

Em toda a história humana, as diversas sociedades formaram alguma espécie de Estado, geralmente iniciando-se numa organização aristocrática que mesclava as autoridades religiosas, civis e militares num corpo só e que com o tempo, com o processo de aprimoramento social, foram se dividindo e se especializando. O Estado foi aos poucos se tornando um ente inconfundível e consciente, no sentido de que a sociedade o pôde perceber, definir e organizar.

Portanto, desde o início da humanidade e da construção progressiva do aparato público, o Estado foi chamado a resolver inúmeros problemas que escapavam das possibilidades da ação individual ou local. Com o crescente dessas necessidades sociais, várias pautas começaram a surgir, exigindo desse órgão de manutenção social uma ação cada vez mais presente e operacional. Quanto mais a sociedade cresce e evolui, mais ela necessita do Estado.

A Idade Moderna surgiu com um paradoxo: limitar o Estado dando-lhe mais poder. Explico: para limitar o aparato público, o homem precisaria de direitos que o protegessem da ação estatal, no entanto o Estado precisa ser forte para conseguir resguardar esses mesmos direitos.

Havia o problema de como definir exatamente quais direitos seriam esses. Alguns sugeriram uma organização meramente conservadora, baseada numa perspectiva estática do direito: são os jusnaturalistas liberais. Se o direito é uma realidade estática, e o Estado é uma organização jurídica, logo, a atuação do aparato estatal é meramente conservar direitos já conquistados, dividindo a sociedade entre os que já os possuem e os que nunca os terão. É o laissez faire, laissez passer que causou a desumanidade contra os operários na revolução industrial; foi o combustível que os liberais deram pros comunistas passarem pela sociedade burguesa como um rolo compressor terrorista.

É preciso dizer também que essa ligação entre o comunismo e o liberalismo não se deu meramente como uma realidade pragmática e oportunista; ambos possuem, em essência, a mesmíssima perspectiva sobre o Estado: é um órgão que representa um mal menor e que na medida do possível deve ser minado, ou até mesmo aniquilado. Muitos esquecem que o grande sonho comunista é uma sociedade sem Estado.

Como contraposição a esse sentimento antiestatal que sacudiu os planos políticos absolutistas do início da idade moderna, pondo fim às monarquias desse tipo, que já no fim do século retrasado, no ocidente, começaram a ser extintas, e que permaneceu nos desenvolvimentos doutrinários gerais até o início do século XX, ergueram-se pensadores que advogavam pela realidade do Estado, como um bom organismo, como um organismo que deveria ser forte.

O século XX sentiu mais profundamente o paradoxo do Estado limitado com mais poder. A sociedade não parava de clamar por sua ação, e ele, não sabendo muito bem como atender as demandas cada vez mais especiais que surgiram, permaneceu como mero instrumento das elites burocráticas. Nos interesses dessas elites, o Estado era poderoso e imperdoável, no que escapava desses interesses, ele era ausente e cego. Eis uma infeliz realidade inerente ao Estado burocrático.

Enfim, no século passado as teorias do Estado absoluto ganharam mais força, o que fez com que movimentos de massas, baseados nesse descontentamento popular quanto à inação estatal, crescessem e advogassem para que a sociedade fosse absorvida pelo aparato público.

É muito difícil expor aqui alguns termos, sem uma prévia preocupação de os definir. O adjetivo “totalitário” é assaz ambíguo. Um Estado totalitário seria um Estado que absorve o total, ou seria assim classificado porque compõe uma estrutura que atende ao total? A primeira situação é desprezível, a segunda é virtuosa.

Já que o Estado é apenas uma construção social, não faz sentido que ele absorva a totalidade, querendo submetê-la a seu jugo. Não queremos polemizar em cima de uma questão já bem entendida a priori por aqueles que no início do estudo científico da política compreendem o que seja um “Estado totalitário”, sendo a este termo posta aquela semântica do aparato público que subjuga a sociedade e todas as expressões humanas ou mesmo religiosas. No segundo caso, o virtuoso, podemos (e devemos) usar o termo “Estado integral”.

O Estado Integral é, portanto, um aparato público desenvolvido não na intenção de absorver a totalidade, mas de se submeter integralmente a ela. Para isso, é necessário que resguarde valores democráticos, pois não teria como atender a todos os setores sociais, sem que estabelecesse meios comunicativos e participativos, possibilitando a integração de todas as atividades sociais em seus quadros. Por outro lado, esse Estado também não pode incorrer no erro de levar ao seu funcionamento as opiniões populares de maneira desorganizada e avulsa, sem qualquer preocupação de ordem, de coesão e de eficiência.

O Estado totalitário e o Estado liberal são duas consequências da burocracia. Aqui, precisamos entender melhor esse fenômeno. Podemos definir a burocracia como um conjunto de cargos inúteis, seja pela vacuidade da organização de Estado, ou também seja pela dominância de poder por oportunistas. Tanto o Estado Totalitário quanto o Estado Liberal padecem igualmente desses mesmos problemas.

É inegável que uma das características constitutivas do Estado é a força. Ora, se fala em exercício de autoridade, esta só se faz presente mediante uso de força. Podemos falar desse aspecto de uma maneira mais entendível que não leve a compreensões afetadas, usando o termo “poder político”. O que se impõe neste caso é como organizar esse poder, pois qualquer desencontro vai levar a cabo a concessão de cargos de autoridade a quem não tem como ou não saiba gerí-los.

Sendo a autoridade algo essencial ao Estado e sendo também ela necessariamente dotada de força, qualquer aparato público que se constitua como tal, deverá necessariamente ser forte. Mas há aqui dois tipos diferentes de força: a de estrutura e de exercício.

A força precisa ser administrada e portanto é necessário uma estrutura competente para atender tamanha obrigação. Se não houver uma estrutura de Estado capaz de descentralizar a administração dessa força, e mesmo assim inevitavelmente houver cargos que a queiram exercer, teremos um aparato público burocrata, cuja intervenção grande parte das vezes se torna um opróbrio.

Visto também que a sociedade civil, sempre em constante mudança e gerando inúmeras reivindicações, não deixa jamais de apresentar ao Estado os seus problemas, ele, burocrático, não sabendo administrar as forças que detém, torna-se inútil diante do corpo social, permitindo a este um acúmulo imenso de pedidos, com uma crescente insatisfação.

Quanto à política, representa uma das missões mais importantes do Sigma a destruição do Estado burocrático e a instauração de um Estado orgânico. Este possui uma estrutura baseada nas realidades orgânicas da sociedade, dando aos grupos naturais a autonomia que tanto necessitam para a manutenção de seus legítimos interesses. Trata-se de uma descentralização administrativa do poder político, pondo o Estado em seu devido lugar de assistente e supervisor, de ferramenta funcional da humanidade; é o Estado forte como estrutura orgânica.

O Estado burocrático é forte porque sua força é impetuosa e injusta. Por falta de uma estruturação adequada, ele se torna, em essência, fraco, ao ponto que suas trapalhadas afligem a sociedade, o que consequentemente concorre para a sua própria queda. Seja uma ditadura infeliz, seja uma democracia libertina, o Estado burocrático é intrusivo e arrasador.

O Estado Integral será forte porque será organicamente estruturado, não porque preencherá seus birôs com uma elite imprestável, causadora de mazelas, tal como vemos atualmente. Essa organização de Estado inaugurará uma nova era política, pois mostrará que é possível estabelecer um aparato público de autoridade sem insuflar no corpo social um sentimento de revolta e de alheamento. É o Estado composto e gerido pela sociedade; é o Estado estruturado para atendê-la em todas as suas demandas, pois ela mesma, através de seus grupos naturais, o fará.

Assim findará o Estado burocrático, que é forte por ser intrusivo ─ para então surgir o Estado orgânico, que é forte por ser organizado.

Jonas de Mesquita
Rio Grande do Norte

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